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Quero ir e vir, sem abrir mão de nada

 Por Sergio Aparecido Alfonso


Quem me conhece sabe que não gosto de frases de efeito, porque elas escondem um monte de mentiras quando você para relfetir sobre o que elas dizem. não gosto de lacração, porque isso é coisa de gente que quer ter a última palavra sem abrir espaço para o contraditório. Também não curto "textão de facebook" porque via de regra são irrefletidos e à semelhança da lacração, querem te forçar a crer numa única versão. Também não tenho muita paciência com perguntas idiotas. Aliás, eu tive um professor de geografia, na sétima série, que dizia que não existe perguntas idiotas, mas idiotas fazendo perguntas. 

Sobre a lacração e o textão, recebi no whatsapp o seguinte texto, que reproduzo na íntegra:


Se a Prefeitura mudar a situação de fechamento do comércio. E a culpa é de quem? A CULPA É SUA!!!

- A culpa é sua, que insiste em usar a máscara no queixo. 

- A culpa é sua, que diz: "Ih, desculpe, esqueci minha máscara...".

- A culpa é sua, que leva criança para "passear" no mercado (mercado é para ser frequentado por 1 pessoa por família, de preferência adulto fora do grupo de risco).

- A culpa é sua, que deixa seu filho adolescente frequentar "role" com os amigos.

- A culpa é sua, que não entendeu que os shoppings reabriram como OPÇÃO, ou seja, não é um convite obrigatório para bater perna sem motivo.

- A culpa é sua que fica aglomerando em festinhas nos alagados.

- A culpa é sua, que lotou restaurantes e bares nas últimas duas semanas.

- A culpa é sua que fica fazendo festa "em família".

- A culpa é sua, que frequentou baladas oficiais e extraoficiais.

A culpa NÃO é da Prefeitura, do comércio, academias, serviços que seguem à risca as medidas de controle e contenção sanitária. 

O fato de você "poder" frequentar lojas, não significa que você "precise" ir a estes locais de aglomeração de pessoas.

E você da terceira idade que lota ônibus em horário de pico ou fora dele sendo grupo de risco.

Agora, POR SUA culpa, tantos serviços serão novamente paralisados ou restringidos. Tantas pessoas serão prejudicadas simplesmente porque nossa população não consegue ter a responsabilidade e consciência de que todos precisam cuidar de todos para que todos possamos sair dessa juntos.  

O que nos resta agora a fazer é esperar que - novamente - a ciência nos ajude além das expectativas, inclusive você que não entendeu , ou não acredita no vírus.


Eu não concordo com quase nada do que está escrito no texto acima no que tange à culpa da persistência da pandemia, sobretudo porque vai refletir na saúde pública e coletiva. Não se trata de não acreditar no vírus, é uma insanidade achar que tem gente que pense isso. As pessoas acreditam no vírus, mas não acreditam nos seus "suseranos". A verdade é que a citação acima se trata de uma exaltação da incompetência dos gestores no combate à COVID-19; enquanto tinam tempo não foram capazes de atrair cursos de medicina para seus municípios, ou ao menos em consórcio municipal não conseguiram atrair o curso para a sua região; não investiram em capacitação para os servidores da saúde, e por isso, muitos alertas de intubações mal feitas que causam sofrimentos aos paciente, nem sempre produzidos pela doença, mas pelo desconforto do equipamento machucando o pulmão; não investiram na estrutura dos hospitais e demais unidades de saúde e por isso não têm recursos para receber os pacientes. Além disso, falta transparência nas ações de  combate à doença e capacidade de convencimento para que as pessoas aceitem as medidas propostas. Há muitas denúncias de desvios de recursos que deveriam se aplicados na saúde e ações referentes à pandemia. Tudo isso leva as pessoas a duvidar da palavra dos administradores públicos.

Fazer um texto como o do exemplo acima, culpando o contribuinte sem levar em consideração as omissões históricas, crônicas e atualíssimas do prefeitos e governadores, defendendo a opressão contra a população, é o mesmo que culpar o oprimido por ser vítima da tirania, defendendo que a opressão é para o bem da sociedade. E assim, a incompetência e os maus gestores estariam justificados, sendo o contribuinte condenado ao recolhimento em "prisão domiciliar" no lugar dos culpados, esses sim, que deveriam ser alijados do serviço público e recolhidos ao cárcere. Se o mau gestor está justificado e a culpa é da população, então, por analogia, deveríamos culpar as vítimas pelos crimes de que são alvos. Ou seja, a vítima de estupro teria que ser condenada por andar na rua em horário impróprio, usar roupas apertadas, saias curtas, caminhar sozinha à noite, de modo que a lascívia do seu agressor seria aceita, tudo para exemplarmente, manter as outras mulheres em casa para sua segurança e seu bem. Do mesmo modo, a vítima de roubo seria culpada porque quis comprar um relógio caro, ou um tênis de marca e decidiu usar em público aguçando a cobiça do delinquente. E assim, a vítima de homicídio seria responsável pela própria morte porque discutiu com alguém que ele deveria presumir ser um desequilibrado que estaria armado. Em vista disso tudo, os presídios deveriam ser esvaziados dos bandidos e enchidos com as vítimas.

Outra coisa que me incomodou muito foi uma pergunta que passou a circular na internet: "Você que é contra o lockdown, caso se contamine com a COVID-19, vai abrir mão da vaga na UTI, já que você curte aglomeração"? Resposta óbvia: Primeiro, eu, pontualmente, sou antissocial por natureza e não faço aglomeração, porém, não tenho nada contra quem se aglomera. Mas, claro que eu não vou abrir mão da vaga na UTI. E aqui passo às seguintes hipóteses para a pessoa caso tivesse me perguntado isso pessoalmente: Eu não uso drogas, mas se aquele teu primo maconheiro, quando estiver viciado, abrir mão de um leito de psiquiatria, talvez a gente converse a respeito; Não bebo, mas se o teu tio alcoólatra, quando tiver um câncer de pâncreas, uma cirrose ou câncer de fígado, abrir mão do tratamento, pode ser que a gente se entenda; Não fumo, mas se teu pai fumante, quando tiver um câncer no pulmão, abrir mão do leito hospitalar, poderemos sentar e levantar a questão; Não dirijo sob efeito de nenhum tipo de substância, mas se aquele teu irmão que bebe vier a bater o carro e se ferir gravemente, abrir mão do leito de UTI de traumas, nós poderemos confabular à respeito; Eu sou homem, hétero, sei disso, e obedeço a Deus pela natureza que me deu, mas se aquele teu amigo que briga contra a própria natureza, querendo fazer amputação de seu órgão genital achando que isso é mudança de sexo, vier a ter complicações e precisar de UTI, mas abrir mão do leito, quem sabe eu pense sobre a tua pergunta. 

Mas eu gostaria de trazer a lume um drama familiar que talvez você não conheça. Em março de 2004, um irmão meu, aos 28 anos de idade, morreu deitado no colo do meu pai no piso da sala da casa deles, agonizando em dor, aguardando por duas horas a chegada de uma ambulância. Não encontravam o motorista, e até hoje não se sabe o motivo de ele estar incomunicável, pois, não foi aberta investigação. Isso foi em Guaíra-PR. Já no dia primeiro de janeiro de 2017, às 7 horas e 15 minutos, minha mãe faleceu por problemas cardíacos, depois de passar o ano de 2016 sendo levada no banho-maria pela saúde pública de Guaíra-PR. Ela estava com uma válvula do coração parada, fazia água no pulmão e isso dificultava a respiração. Naquele dia primeiro de janeiro, às 7 horas e 30 minutos, quando a maioria dos brasileiros acordava para preparar a churrasqueira, a carne, a salada, a maionese, a caixa de gelo com bebidas para o merecido almoço de comemoração ao feriado universal, eu me preparava para viajar de Foz do Iguaçu para Guaíra, velar minha mãe. Por voltas das 17 horas e 30 minutos, quando a maioria dos brasileiros pegava a alça do copo de cerveja, chope ou vinho para levar à boca, eu pegava na alça do caixão da minha mãe para levá-la ao túmulo. 

Em 2010, em meado de agosto, senti mais uma cólica renal das inúmeras que tive. Paguei do próprio bolso uma ultrassonografia e descobri que tinha um cálculo renal (uma pedra no rim), com 1,5 cm  de diâmetro por 3,2 cm de comprimento. Uma pedra desse tamanho é quase a área de um cálice renal (cavidade que fica no interior do rim). Fui ao posto de saúde, consultei um clínico geral que me encaminhou para a fila para ser tratado por em especialista. A sequência deveria ser consulta, exames, nova consulta, exames pré-operatórios, e, finalmente, uma cirurgia. Pois bem, apenas no final de 2013 foi que consegui uma consulta, sem conclusão nenhuma e nunca mais. O detalhe é que eu era o nº 1786 da lista de espera. 

Devido ao tamanho da pedra que foi detectada, o rim pode simplesmente silenciar. Sabe o que é silenciar? É paralisar. O rim deixa de funcionar. Você entende isso? Eu posso ter perdido o rim por falta de atendimento médico. Mas a morte do meu irmão e da minha mãe e a perda do meu rim não vão te sensibilizar. Veja bem, minha mãe e meu irmão já morreram, nada mais pode ser feito por eles. Mas eu estou vivo e aguardo o atendimento até hoje. Acredito que o ano de 2021 vai acabar e eu não serei chamado, se é que o cadastro ainda vale, se é que meu nome ainda está lá. O atendimento não veio em 2020, a culpa é da COVID-19. Eu até concordo, porque uma cólica renal se resolve com uma injeção de buscopan na veia e um valium para dormir. Ao passo que uma falta de ar não se resolve tão facilmente. Longe de mim tal mal. Se em 2020 a culpa foi da COVID-19, em 2021 as pessoas já conseguiram culpar o contribuinte, ou seja, em mim. Mas no meu caso de patologia renal não ser atendido, até 2019 o não atendimento era culpa de quem?

Além do drama particular e familiar narrado, existem inúmeros casos de pessoas que morrem aguardando vagas nas UTIs por ene motivos de saúde. Pessoas cujos parentes, dois, até três anos depois de mortos recebem informação de que uma mamografia foi liberada pela auditoria da Secretaria Municipal de Saúde. A sessão de quimioterapia liberada depois de seis meses da morte do paciente e por aí vai. 

Por fim, a verdade é que pago grandes cifras em reais em imposto de renda retido na fonte, além daquilo que é comum a todos. Eu pago impostos altos e caros para ter serviço público de qualidade quando eu precisar. Não se pode abdicar do direito de ir e vir para facilitar a vida de um gestor incompetente, isso seria a premiação do ócio. A saúde é um direito garantido e um dever do Estado, consignados na Constituição Federal de 88 no seu artigo 196, e, de igual forma, o direito à liberdade é assegurado pela mesma Carta Magna em seu artigo 5º, caput. Em ambos os casos,  saúde e liberdade, são direitos inalienáveis, ou seja, direitos dos quais não se pode abrir mão. E eu não vou abrir mão de nada que tenho direito e a duras penas financio, nem você, nem ninguém também deveria faze-lo. Você é quem deveria pedir ao teu político para largar mão de ser incompetente, ou nalguns casos,  pedir para ele deixar de ser ladrão. 

Comentários

  1. O que mais vemos nos dias de hoje é, os "defensores da democracia"se sujeitando ao autoritarismo dos governantes para justificar a incompetência dos seus bandidos de estimação.

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  2. Muito bom!!!
    Tem que insistir com o SUS...
    Incrível que só a minha dor dói em mim, a dor do outro não... A falta de amor dói em todos no mundo. Pior que fica por isso mesmo.

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