Por Sergio Aparecido Alfonso
Em todo o tempo ama o amigo e para a hora da angústia nasce o irmão (Provérbio 17.17)
Sair pelo mundo despreocupadamente envolve mais do que tranquilidade com a própria segurança física, mas também implica em ter onde recorrer em caso de necessidade. Já imaginou sair viajando por uma região e pensar que em tais e tais pontos poderá encontrar ajuda caso precise? Dizem que os vizinhos devem ser muito bem tratados, porque na hora da necessidade eles chegarão antes mesmo do que os parentes. Eles te ajudarão em tudo. E isso não pode ser negado. Já testemunhei casos em que numa emergência era um vizinho dando as primeiras assistências para as pessoas.
É isso que nos faz ter o sentimento de pertencimento a uma comunidade. A vizinhança ajudando a vizinhança sem buscar algum tipo de recompensa, ou ter feito algo em favor de alguém em virtude de uma afinidade precedente. É o tal 'fazer o bem, sem olhar a quem'. Depois dos momentos ruins nascem as amizades, a pessoa assistida dá uma festa, convida o vizinho, vai para igreja, convida o vizinho, enfim, vai fazer algum evento importante, chama o vizinho. É o desejo de demonstrar ao vizinho que ficou grato pela mão estendida no momento da adversidade. E assim, um laço se forma para muito tempo.
Mas a amizade é diferente. Quando se trata de amigo, os convites são naturais, não são feitos como forma de agradecer ou recompensar algo. Se faz as coisas por puro sentimento relacional antecedente. É o querer estar junto porque existe afeto entre as partes. É sinceridade no relacionamento sem aquela sensação de dívida. Pude perceber isso em várias oportunidades. Tenho muitos amigos. Há pessoas cuja proximidade vai além do ambiente de compromissos formais ou institucionais. A amizade suplanta o coleguismo, dando liberdade para dizer sim ou não, conforme o ânimo de momento, sem sentir culpa por isso.
Jesus, nosso amigo, assim nos chama em João 15.15. Ele disse que já não chama mais os seus discípulos de servos, porque o servo não sabe o que o seu Senhor faz, mas os amigos sim, a esses é revelada a vontade Pai. Os servos têm uma vaga ideia e vão sendo informados no passo a passo, enquanto os amigos podem ter conhecimento de um plano inteiro. Para tanto, ou seja, para ser amigo de Jesus, Ele requer uma pequena coisa: obediência. Basta fazer o que Cristo manda (João 15.14). Porque no fundo é isso, a amizade com Jesus é questão de confiar. Fazer o que ele manda é, como se diz, entrar de cabeça. Acreditar sem se preocupar com o resultado futuro. Fazer o que Cristo manda, não é apenas cumprir normas, mas entrar junto com Ele nos seus projetos, na sua obra. Assim, sendo alguém com quem Jesus pode contar, você se torna seu amigo.
Me lembro de quado servi a Marinha do Brasil em 1992, turma 1, na Escola de Aprendizes Marinheiros - EAMSC, do 5º Distrito Naval, mais especificamente na Escola de Formação de Reservistas Navais - EFRN, que ficava dentro da EAMSC. Éramos 90 marinheiros recrutas. Alguns do Paraná, outros de Santa Catarina e a maioria do Rio Grande do Sul. Aprendemos com o nosso instrutor, Sargento Neron, fuzileiro Naval, que deveríamos ter espírito de corpo. Se um errasse, todos seriam punidos com mais exercícios físicos. Mas havendo lealdade e esforço, todos estaríamos bem. Acho que todos as pessoas que serviram às Forças Armadas conhecem bem isso. Não somos membros isolados, mas um só corpo. Essa ideia militar de unidade vem de muito tempo. Paulo usa essa metáfora em Romanos 12.4, onde somos membros uns dos outros. Ou seja, mesmo que uma das mãos esteja na outra extremidade, todos os membros são parte do todo, e ligados entre si numa relação de interdependência.
Por entender esse fato é que naquele período, com raras exceções, nasceu um grande círculo de amizade envolvendo todos os recrutas. Porque dependíamos da lealdade e esforço um do outro. Então, aprendemos a confiar em todos e cada um, de modo que não escolhíamos com quem trabalhar. Quando se pedia voluntários para fazer algo, todos levantávamos as mãos em sinal de aceitação ao desafio, sem nos preocupar com quem seria o outro recruta que iria para a mesma missão. Pois, sabíamos que poderíamos contar um com o outro. Assim, quanto mais rápida a apresentação de um voluntariado, mais rápido os problemas teriam solução e mais rápido poderíamos alcançar o descanso coletivo. Em função disso, sem que nos déssemos conta, estávamos criando um ambiente fraternal. Nos tornamos amigos.
Com o passar do tempo, o serviço militar chegou ao fim, cada um foi para a sua cidade, e se envolveu com sua vida pessoal, constituindo família, entrando numa profissão, se fixando na vida, e se conduzindo na sociedade. Mas quis Deus que aos poucos a turma fosse se refazendo. Grupos de redes sociais nascendo, laços de amizade sendo reforçados e confiança sendo reencontrada. A turma resolveu que ia se confraternizar, com o significado de fazer união fraternal, de fraternidade, que quer dizer laços de irmandade, que é a amizade entre irmãos. Encontros da turma foram sendo realizados, até que chegamos ao nono encontro dos irmãos de turma 1/92. Isso mesmo, irmãos.
O nosso verso inicial diz que devemos amar o amigo em todo tempo, e na angústia nasce o irmão. A fraternidade que tínhamos no período do serviço militar obrigatório - que depois a gente transforma em voluntário - foi uma época em que desenvolvemos o sentimento que nos tornou irmãos. Irmãos fazem sacrifícios uns pelos outros. Foi isso que nos fez ser voluntários para determinadas missões sem saber quem seria o ajudante. Porque tínhamos certeza de que do sucesso de um trabalho bem realizado a turma toda seria beneficiada.
Assim, Jesus se entregou voluntariamente por nós, como ele disse em João 15.13. Ele deu a sua vida em nosso lugar, para que hoje pudéssemos ter com Ele uma relação de confiança. O Mestre entrou num sacrifício voluntário sem se preocupar quem seriam seus companheiros. O resultado é que o trabalho feito por Jesus, pelos amigos, beneficiou a turma toda. Todos podemos ter descanso porque ele terminou a missão com sucesso.
No dia oito de fevereiro de 2020 foi o encontro de nº 9 da minha turma de marinheiros na cidade de Rio Grande, no Estado do Rio Grande do Sul. Estive lá, foi o primeiro de que participei. Senti um ambiente agradável, familiar, de amizade, nostalgia, alegria e sentimentos de afinidade e pertencimento. Sentimos saudades de quem não pode estar, nos preocupamos com as informações sobre a saúde de alguns e nos felicitamos com recordações gerais.
Alguns me ofereceram hospedagem, outros fizeram convites para estar em suas casas, enfim, parece que estávamos de novo em 1992 quando ainda éramos jovens voluntários da pátria, quando tudo o que tínhamos era um ao outro para uma missão. Aqueles momentos de tensão que vivemos na escola nos forjou para o mundo, e também nos moldou para a vida e para o bom e respeitoso trato de uns para com os outros. Depois de vinte e oito anos sem os encontrar, num único dia de encontro, desde o momento em que nos vimos de novo, parece que nunca estivemos longe, pelo contrário, parece que sempre estivemos juntos nesses anos todos, dia a dia. Aqueles sempre se encontram, me receberam pela primeira vez depois de tanto tempo, com a mesma integração que seria se eu estivesse no churrasco de último fim de semana na casa de qualquer um deles. É, eu sou da turma.
Alguns me ofereceram hospedagem, outros fizeram convites para estar em suas casas, enfim, parece que estávamos de novo em 1992 quando ainda éramos jovens voluntários da pátria, quando tudo o que tínhamos era um ao outro para uma missão. Aqueles momentos de tensão que vivemos na escola nos forjou para o mundo, e também nos moldou para a vida e para o bom e respeitoso trato de uns para com os outros. Depois de vinte e oito anos sem os encontrar, num único dia de encontro, desde o momento em que nos vimos de novo, parece que nunca estivemos longe, pelo contrário, parece que sempre estivemos juntos nesses anos todos, dia a dia. Aqueles sempre se encontram, me receberam pela primeira vez depois de tanto tempo, com a mesma integração que seria se eu estivesse no churrasco de último fim de semana na casa de qualquer um deles. É, eu sou da turma.
Na vida com Jesus aconteceu o mesmo. Ele deu a vida em nosso lugar como sacrifício por pura e sincera amizade (João 15.13) para nosso conforto e bem estar. Ele quer nossa amizade, então faça o que ele manda (João 15.14), ou seja, entre com Ele numa missão sem medir esforços, voluntariamente. Ele te chamará de amigo (João 15.15), te mostrará tudo, te revelará seus planos, te levará para a casa dele, e você se sentirá como se nunca tivesse ficado longe. Você se unirá a Cristo numa atmosfera de eterna confraternização, ou seja, união fraternal, entre verdadeiros irmãos. Você será da turma dos cristãos, da primeira turma de todos os tempos. Há maior segurança que isso? Claro que não. Jesus é nosso melhor amigo, e está ao nosso lado em tempo integral.
Adsumus! 👊🏻⚓🙏🏻
ResponderExcluirGrato pela leitura e pelo prestígio. Nos vemos em Floripa ano que vem. Se Deus quiser.
ResponderExcluirMeu irmão, quando escreveste que após todos esses anos o sentimento de que sempre estivemos juntos foi visível para você, isso foi plantando em nós naquela época, foi plantando as sementes da amizade da união e da fraternidade e elas germinaram e formaram essa grande família.
ResponderExcluirBom dia amigão. Eu me senti como se tivesse naquela época, só que mais experiente. Obrigado por fazer parte disso conosco.
ExcluirAbraço
"Amigo é coisa pra se guardar no lado esquerdo do peito"!! Muito obrigado por ser meu amigo, muito obrigado por ser meu irmão!!!
ResponderExcluirBom dia Souza. A honra é toda minha. Fico feliz em saber do carinho de todos.
ExcluirAbraço
Lindo depoimento MEU AMIGO. Seu relato resume com maestria a essência da amizade e sua ligação com um dos significados da entrega de Cristo por nós. O acolhimento que recebeu da Turma 1/92 é reflexo da nossa própria história e dos valores nela contidos. Parabéns!
ResponderExcluirBoa noite Atila. Obrigado pelas palavras. Se tivesse consultado antes, teria feito uma autoria conjunta nesse texto.
ResponderExcluirAbraço